Obrigatoriedade
do registro de jornada dos motoristas profissionais para empresas com até 20 empregados
A obrigatoriedade do controle da jornada de trabalho decorre de mandamento coercitivo contido no artigo 74 da CLT, impondo ao empregador, nos estabelecimentos com mais de 20 (vinte) empregados (incremento feito pela Lei 13.874/2019), a obrigação de fazer consistente na anotação da hora de entrada e de saída, em registro manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções expedidas pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, permitida, inclusive, a pré-assinalação do período de repouso.
Por
outro lado, é permitida a utilização de sistemas alternativos de controle de
jornada de trabalho, desde que as empresas estejam autorizadas por negociação
coletiva, conforme Portaria nº 373/2011, também do antigo Ministério do
Trabalho. Oportuno salientar que, de acordo com a inclusão promovida pela Lei
nº 13.467/2017 (Art. 611-A, inc. I, da CLT), a convenção coletiva e o acordo
coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem
sobre pacto quanto à jornada de trabalho, observados os limites
constitucionais.
Cizânia
há em relação à obrigatoriedade do cômputo da jornada para motoristas de pequenas
empresas, nas quais não foram contratados mais de 20 (vinte) colaboradores. A
matéria não é pacífica na jurisprudência, comportando uma interpretação
sistemática dos dispositivos legais pertinentes.
A
Lei 13.103/2015, que dispõe sobre o exercício da profissão de motorista,
manteve a mesma sistemática contida na legislação anteriormente revogada (Lei
12.619/2012), com a seguinte diretriz:
Art. 2º São
direitos dos motoristas profissionais de que trata esta Lei, sem prejuízo de
outros previstos em leis específicas:
(...) V - se
empregados:
(...) b) ter
jornada de trabalho controlada e registrada de maneira fidedigna mediante
anotação em diário de bordo, papeleta ou ficha de trabalho externo, ou sistema
e meios eletrônicos instalados nos veículos, a critério do empregador;
Como
se pode notar da própria dicção da norma, o registro da jornada de trabalho, de
maneira fidedigna (real, autêntica ou verídica), é um direito subjetivo do
próprio empregado motorista, não alcançando nenhuma exceção catalogada pelo
legislador ordinário na referida lei, tendo em vista que o labor externo definitivamente
não é mais causa excludente para o reconhecimento de sobrejornada neste
particular, que, aliás, pode ser aferida incontinenti por meios eletrônicos e
de rastreamento por satélite.
Ora,
havendo conflito aparente de normas (antinomia jurídica), o interprete deve
lançar mão de um dos meta-critérios clássicos de solução: I) hierárquico; II)
cronológico; e III) especialidade. Na espécie, sobreleva-se a disposição
contida na Lei 13.103/2015, justamente por se revelar uma legislação mais
específica para a categoria dos motoristas. Assim, pelo princípio da
especialidade (inteligência do art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei 4.657/1942 - Lei
de Introdução às normas do Direito Brasileiro), não há que se cogitar da
aplicação da exceção ao registro de jornada para empregadores que mantenham
menos de 20 (vinte) empregados, disposta no artigo 74, § 2º, da CLT. Nesse
mesmo sentido:
AGRAVO DE
INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. MOTORISTA. OBRIGATORIEDADE DO CONTROLE DE JORNADA.
APLICAÇÃO DA LEI 12.619/12. VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 5º, LV, 7º, XXVI, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 62, I, 74, § 2º, DA CLT E CONTRARIEDADE À SÚMULA 338, DO
C. TST, NÃO CONFIGURADAS. ARESTO INSERVÍVEL. O E. Regional assentou que,
posteriormente à edição da Lei 12.619/2012, estava a reclamada, ora agravante,
obrigada a manter o controle da jornada de trabalho de seus empregados,
exercentes das funções de motorista, o que não foi cumprido. Nesse contexto, o
entendimento adotado pelo E. Regional está em consonância com a jurisprudência
desta C. Corte, no sentido de que a Lei 12.619/2012 instituiu a obrigatoriedade
das empresas manterem controle da jornada de trabalho de seus motoristas.
Precedentes. Incólumes, assim, os artigos 5º, LV, 7º, XXVI, da Lei Maior, 74, §
2º e 62, I, da CLT, bem como a súmula 338, do C. TST. Aresto inservível (artigo
896, “a”, da CLT e OJ 111, da SBDI -1, do C. TST). Agravo de instrumento a que
se nega provimento. (TST; AIRR-710-75.2013.5.23.0009; Relatora: Desembargadora
Convocada Jane Granzoto Torres da Silva; Julgado em 11 de Novembro de 2015.)
HORAS EXTRAS.
MOTORISTA. CONTROLE DE JORNADA. INAPLICABILIDADE DA EXCEÇÃO DO ARTIGO 74, § 2º,
DA CLT. Com a entrada em vigor da Lei nº 12.619/2012 e, depois, da Lei nº
13.103/2015, restou estabelecido que os motoristas profissionais têm direito à
jornada de trabalho controlada de maneira fidedigna pelo empregador, por
qualquer meio idôneo, sem qualquer ressalva. Dado o princípio da especialidade,
é inaplicável à hipótese a exceção de obrigatoriedade de controle aos
empregadores que tenham menos de dez empregados, disposta no artigo 74, § 2º,
da CLT. Recurso do reclamante provido, no aspecto. (TRT-4;
RO-0022128-75.2015.5.04.0511; Relatora: Lais Helena Jaeger Nicotti; Publicado em 14/05/2018.)
Mais
do que uma mera rotina administrativa, a instituição do controle de ponto para
os motoristas evidencia, antes de tudo, uma política efetiva de saúde e
segurança no trabalho, já que, no Brasil, verificam-se índices alarmantes sobre
o consumo de drogas ilícitas, principalmente “rebite” e cocaína, por parte de
caminhoneiros, com o intuito perverso de tirar o sono e cansaço para cumprir
longas jornadas em estradas que apresentam péssimas condições de trânsito, o
que inclusive pode acarretar graves acidentes. Em miúdos, trata-se de medida
profilática e salutar que beneficia ambos os partícipes da relação de trabalho.
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