A
cláusula constitucional da solidariedade e o isolamento físico como
vacina social
Fábio
Luiz Pacheco1
A
cada dia impressionam os números advindos da pandemia gerada pela
Covid-19 (coronavírus). Infestações biológicas não encontram
barreiras, não se limitam a dadas classes sociais nem perguntam se
podem chegar. A dura e atual realidade experimentada pelo mundo nas
últimas semanas traz à tona, aqui e acolá, a capacidade humana de
unir-se em prol de um objetivo comum e maior, qual seja, a
resistência ao novo vírus.
Importante
saber que a etimologia da palavra solidariedade tem origem no latim
“solidus”, ou seja, firme, inteiro e sólido. De igual,
menciona-se que da expressão francesa “solidarité”, cunhada em
1765, advém o termo “responsabilidade mútua”2.
Pontua-se
que a ideia de solidariedade social não se restringe, somente, à
perspectiva da caridade, da filantropia e de condutas realizadas por
mera liberalidade. Melhor dizendo: no atual momento, em que postas em
xeque as políticas de saúde pública globais, exige-se mais do que
mera “liberalidade”.
O
zelo, a preocupação e a empatia sociais derivam da cláusula
constitucional da solidariedade. Nos termos do art. 3º, I, da
Constituição Federal, constituem objetivos fundamentais da
República Federativa do Brasil, dentre outros, a construção de uma
sociedade livre, justa e solidária.
O
Estado brasileiro, então, deve envidar recursos e esforços para que
a sociedade nacional seja cada vez mais solidária. Ressalta-se que3:
A
solidariedade é a expressão mais profunda da sociabilidade que
caracteriza a pessoa humana. No contexto atual, a lei maior determina
– ou melhor, exige – que nos ajudemos, mutuamente, a conservar
nossa humanidade, porque a construção de uma sociedade livre, justa
e solidária cabe a todos e a cada um de nós.
No
sistema das nações unidas, a agência especializada em saúde e
autoridade mundial no assunto é a Organização Mundial de Saúde
(OMS), a qual esclarece que o surto da doença causada pelo novo
coronavírus (Covid-19) constitui uma Emergência de Saúde Pública
de Importância Internacional – o mais alto nível de alerta da
Organização, conforme previsto no Regulamento Sanitário
Internacional4.
Por tal motivo, em 11 de março de 2020, a Covid-19 foi caracterizada
pela OMS como uma pandemia.
Nesse
diapasão, crível destacar que a quase totalidade das informações
trazidas por especialistas em saúde pública revela que a melhor
maneira de “frear” o surto do coronavírus é o isolamento
social. Destacam-se, no ponto, as orientações tanto da OMS quanto
do Ministério da Saúde5
brasileiro.
E
aqui está a importância da solidariedade social – objetivo do
Estado brasileiro. Para prevenir não só a si mesmo, mas também a
outras pessoas de, eventualmente, serem contaminadas pela Covid-19, é
crucial que, momentaneamente, enfrente-se a quarentena. O isolamento
físico representa uma vacina social!
E
referido enfrentamento, como política de Estado (apartidária,
portanto), deve vir acompanhada de mecanismos transparentes quanto às
ações advindas do governo, com especial relevo à destinação dos
cofres públicos. O foco orçamentário no enfrentamento da crise,
pois, é medida que se impõe. Daí porque diversos órgãos e
Poderes estão a destinar recursos à área da Saúde6
– em verdadeiro esforço conjunto e solidário.
O
momento, pois, exige a tomada de medidas preventivas, que extrapolam
o cunho individualista e objetivam garantir uma proteção suficiente
à saúde e à vida das pessoas (princípio da prevenção).
A
esperança e o mandamento constitucional é o de que saiamos deste
momento mais fortalecidos e mais coesos como democracia recente, a
fim de que seja dada concretude à solidariedade social objetivada
pela Carta Maior.
______________________________
1Especialista
em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela PUC/RS.
Ex-assessor jurídico municipal e da Confederação Nacional de
Municípios (CNM – Brasília/DF). Ex-chefe de Cartório Eleitoral
(TRE/RS). Ex-assistente de juiz do trabalho (TRT/3a
Região). Ex-oficial de justiça federal da Justiça Federal do RS
(TRF/4a
Região). Ex-assistente de desembargador (TRT/4a
Região). Juiz do Trabalho Substituto do TRT da 8ª Região.
Professor e palestrante.
3
MORAES, Maria Celina Bodin de. O princípio da solidariedade, In:
PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabela Franco; NASCIMENTO FILHO,
Firly. (coord.), Os princípios da Constituição de 1988, p. 178.
Apud ROSENVALD, Nelson. Dignidade Humana e Boa-fé no Código Civil.
São Paulo: Saraiva, 2005, p. 173.
4
https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:covid19&Itemid=875
5
https://www.saude.gov.br/noticias/agencia-saude/46540-saude-anuncia-orientacoes-para-evitar-a-disseminacao-do-coronavirus
6
A título de exemplo, citam-se diversas decisões da Justiça do
Trabalho que estão destinando valores oriundos de condenações
judiciais em ações coletivas a Secretarias estaduais e municipais
de saúde.
https://site.trt19.jus.br/noticia/corregedoria-do-trtal-recomenda-destinacao-de-valores-de-acoes-para-combate-ao-covid-19
Excelente destaque sobre a relevância da solidariedade e seu preceito constitucional.
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