Intervalo
especial do rurícula - Pausas suprimidas
Embora
já tenhamos tratado do assunto neste blog, passamos a realizar uma
espécie de “atualização jurisprudencial” sobre o tema – uma
vez que o C. TST mostra-se quase pacificado sobre ele.
A
Constituição Federal prevê, em seu art. 7º, XXII, como direito
dos trabalhadores urbanos e rurais, a “redução dos riscos
inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e
segurança”. A esse comando adequa-se o art. 13 da Lei nº
5.889/73, ao dispor que “nos locais de trabalho rural serão
observadas as normas de segurança e higiene estabelecidas em
portaria do ministro do Trabalho e Previdência Social”. O Decreto
nº 73.626/74 (que aprova o regulamento da Lei dos Rurais), em seu
artigo 28, delega à portaria do então Ministro do Trabalho e
Previdência Social o estabelecimento de regras atinentes à
segurança e à higiene nos locais de trabalho rural.
Nos
limites de sua competência constitucional, o extinto Ministério do
Trabalho e Emprego – MTE editou a NR-31, a qual trata de Segurança
e Saúde no Trabalho na Agricultura, Pecuária, Silvicultura,
Exploração Florestal e Aquicultura. A norma em questão prevê,
entre outras medidas de segurança e higiene, que:
(…)
31.10.7 Para as atividades que forem realizadas necessariamente em
pé, devem ser garantidas pausas para descanso.
...
31.10.9
Nas atividades que exijam sobrecarga muscular estática ou dinâmica
devem ser incluídas pausas para descanso e outras medidas que
preservem a saúde do trabalhador.
Embora
a aludida NR-31 não estabeleça o número e a duração dos
referidos intervalos para os trabalhadores que desenvolvam suas
atividades nos moldes previstos nos itens 31.10.7 e 31.10.9, tal
omissão não pode ser vista como sinônimo de descumprimento da
norma.
Isso
porque, realizando uma interpretação sistemática e analógica da
ordem jurídica pátria, por força do que dispõem os artigos 4º da
LINDB e 8º da CLT, é possível encontrar uma solução para o caso.
Nos
dias de hora, pois, o C. TST vem entendendo, de forma amplamente
majoritária, que em face da lacuna decorrente da NR-31 é possível
aplicar, analogicamente, os intervalos previstos no art. 72 da CLT
(“Nos serviços permanentes de mecanografia (datilografia,
escrituração ou cálculo), a cada período de 90 (noventa) minutos
de trabalho consecutivo corresponderá um repouso de 10 (dez) minutos
não deduzidos da duração normal de trabalho”) aos trabalhadores
rurais. Nesse sentido, os seguintes julgados:
RECURSO
DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI N.º13.015/2014.
TRABALHADOR RURAL. PAUSAS DA NR 31 DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E
EMPREGO. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ARTIGO 72 DA CLT. A
jurisprudência deste Tribunal é no sentido de que ante a ausência
de previsão expressa sobre o tempo da pausa da NR-31 do Ministério
do Trabalho e Emprego, aplica-se analogicamente o disposto no artigo
72 da CLT ao trabalhador rural que realiza atividades em pé ou com
sobrecarga muscular estática ou dinâmica, como forma de lhe
garantir esse direito. Precedentes. Recurso de revista conhecido e
provido. (…) (RR-302-79.2015.5.09.0017, 2ª Turma, Relatora
Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 09/08/2019).
RECURSO
DE REVISTA INTERPOSTO PELA RECLAMANTE. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO
NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. 1. PAUSAS PREVISTAS NA NR Nº 31
DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. CORTADORA DECANA-DE-AÇÚCAR.
APLICAÇÃOANALÓGICADO ART. 72 DA CLT. CONHECIMENTO E PROVIMENTO. I.
Em face da lacuna da NR Nº 31 do MTE quanto às condições e o
tempo do período de descanso do trabalhadorrural, a jurisprudência
desta Corte firmou-se no sentido de que deve ser aplicado
analogicamente o art. 72 da CLT, nos termos dos arts. 8º da CLT e 4º
da LINDB, para conceder ao cortador manual
decana-de-açúcarumintervalode dez minutos de descanso a cada
noventa minutos de trabalho consecutivo, não se deduzindo o referido
período da duração normal do trabalho. Julgados da SBDI-1 desta
Corte. II. Ao entender incabível ointervaloprevisto na NR nº 31 do
MTE, a Corte Regional violou o art. 72 da CLT. III. Recurso de
revista de que se conhece, por violação do art. 72 da CLT, e a que
se dá provimento. (...) (RR-839-91.2011.5.15.0100, 4ª Turma,
Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 23/08/2019).
AGRAVO
EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DECISÃO
PUBLICADA A PARTIR DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. TRABALHADOR
RURAL. INTERVALOS PREVISTOS NA NR-31 DO MTE. APLICABILIDADE, POR
ANALOGIA, DO ARTIGO 72 DA CLT. Ainda que a NR-31 não estabeleça
a duração das pausas nela previstas, é aplicável aos
trabalhadores rurais, por analogia, nos termos dos artigos 8º da CLT
e 4º da LINDB, a disposição inserta no artigo 72 da CLT, que
garante pausas de 10 minutos a cada 90 minutos de trabalho
continuado, sob pena de se tornar inócua a garantia de descanso
trazida pelos itens 31.10.7 e 31.10.9 da NR-31. Precedentes desta
Corte. Agravo a que se nega provimento. (Processo: AgR-AIRR-
10841-67.2015.5.03.0148, Relator Ministro: Cláudio Mascarenhas
Brandão, Data de Julgamento: 07/03/2018, 7ª Turma, Data de
Publicação: DEJT 16/03/2018).
AGRAVO
DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. (...) 2. PAUSAS PARA DESCANSO
(NR-31). A atual, iterativa e notória jurisprudência deste
Tribunal é a de que, ante a ausência de previsão expressa sobre o
tempo da pausa constante na NR-31 do Ministério do Trabalho e
Emprego, mostra-se cabível a aplicação analógica do artigo 72 da
CLT ao trabalhador rural que realiza atividades em pé, ou com
sobrecarga muscular estática ou dinâmica, como forma de lhe
garantir esse direito. (...) Agravo de instrumento conhecido e não
provido. (Processo: AIRR - 10061-23.2015.5.15.0107 , Relatora
Ministra: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento: 14/03/2018, 8ª
Turma, Data de Publicação: DEJT 16/03/2018).
Com
base em tais fundamentos, são cada vez mais comuns as condenações
de empregadores rurais ao pagamento de dez minutos diários, a título
de horas extras, a cada noventa minutos de trabalho, em face das
pausas suprimidas.
*
Fábio Luiz Pacheco
Especialista
em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela PUC/RS.
Ex-assessor jurídico municipal e da Confederação Nacional de
Municípios (CNM - Brasília/DF). Ex-Técnico Judiciário – Área
Administrativa do TRE/RS (chefe de Cartório Eleitoral). Ex-Analista
Judiciário – Área Judiciária do TRT da 3ª Região (assistente
de juiz do trabalho). Ex-oficial de justiça federal da Justiça
Federal do RS no TRF da 4ª Região. Ex-Analista Judiciário – Área
Judiciária do TRT da 4ª Região (assistente de juiz e de
desembargador do trabalho). Juiz do Trabalho no TRT da 8ª Região.
Professor e palestrante.
Fera demais, Fábio! Essa página, que já era excelente, ficou melhor ainda! Grande abraço!
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