Teletrabalho
escravo
O avanço da globalização
econômica e a reestruturação do mercado de trabalho trazem novos
desafios à formação profissional, obrigando as empresas a buscarem
outras estratégias para obterem lucro por meio do uso racional da
tecnologia, o que implica em uma generalizada potencialização da
capacidade produtiva da força de trabalho.
Uma consequência bastante
visível deste “admirável mundo novo”, centra-se na nova
dinâmica empreendida pelo teletrabalho, entendido aqui como aquele
ofício realizado a distância, de forma remota, por meios
telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão
tecnológica, não se distinguindo em termos de subordinação com o trabalho realizado no estabelecimento do empregador. Nas palavras
do legislador ordinário, “considera-se teletrabalho a prestação
de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador,
com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação
que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo”
(art. 75-B da CLT).
De outro lado, o operador do
direito ao lidar com o tema da escravidão contemporânea certamente
se deparará com questões afetas ao abuso massivo da utilização da
mão-de-obra humana com o fim precípuo de precarizar as estruturas de trabalho, sem a observância das condições mínimas de saúde e
segurança deste meio ambiente especial. É a coisificação do
próprio potencial humano, malbaratando os pilares fundamentais do
trabalho decente (direitos fundamentais, diálogo social, proteção
social e emprego produtivo). Conforme tipificação contida no art.
149 do Código Penal, divide-se em duas espécies distintas: o
trabalho forçado (cerceamento à liberdade de locomoção) e o
trabalho em condições degradantes (aquele em que não são
respeitadas as garantias básicas para o resguardo da dignidade do
trabalhador).
Assim, a chamada “escravidão
digital”, ou utilizando um epíteto de melhor percepção semântica
(teletrabalho escravo), é exatamente a junção de dois conceitos já
conhecidos pela ciência jurídica (teletrabalho e trabalho escravo
contemporâneo), cuja aglutinação procura expressar aquela situação
grave de superexploração laboral engendrada por meios telemáticos
e virtuais.
Conforme lição de Manuel
Martin Pino Estrada:
O “teletrabalho escravo” é
aquele que, em vez de ser realizado no mundo físico, é realizado na
internet através de ferramentas tecnológicas que permitem o uso da
telecomunicação e telemática, privando o teletrabalhador da sua
liberdade por causa do controle virtual (mais ainda no teletrabalho
em domicílio) e que se encontra privado de romper o vínculo em
razão de coação moral ou psicológica advinda de dívidas
artificiais contraídas com o empregador.
Destarte, qualquer que seja a
metodologia ou o meio empregado para a utilização lucrativa da mão-de-obra,
não há espaço interpretativo para que se aceite o vilipêndio de
direitos e garantias mínimas existentes na relação de trabalho, o
que induz uma interpretação prospectiva do art. 62, inc. III, da
CLT, sob pena de subverter toda ordem social democratizante calcada
na dignidade da pessoa humana.
___________________
ESTRADA,
Manuel Martin Pino. O TELETRABALHO ESCRAVO. Revista Eletrônica da
Faculdade de Alta Floresta, [S.l.], v. 2, n. 1, maio 2013. ISSN
2238-5479. Disponível em:
<http://www.ienomat.com.br/revistas/refaf3.0/index.php/refaf/article/view/95>.
Acesso em: 04 nov. 2019.
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