Contraditório fraco x Contraditório forte
Processo
é uma entidade jurídica complexa, que pode ser definida como
procedimento, desenvolvido em contraditório, animado por uma relação
jurídica processual. Percebe-se, neste diapasão, que o instituto do
contraditório é elemento integrante e essencial da própria
atividade jurisdicional.
É
cediço que a palavra contraditório é originada do latim
“contradictio”, que significa “resposta”, “objeção” ou
“contra-argumento”, bem como da expressão “contra dicere”,
que veicula a ideia de “falar contra”.
No
inciso LV, do artigo 5°, da Constituição Federal, está albergada
a garantia do contraditório que nada mais é do que a permissão
fundamental consistente na contranitência da parte litigante em face
da pretensão movida em seu desfavor com todos os meios probatórios
e prazos garantidos pelo ordenamento jurídico.
Nas
palavras de Nelson Nery Jr:
“Por
contraditório deve entender-se, de um lado, a necessidade de dar
conhecimento da existência da ação e de todos os atos do processo
às partes, e, de outro, a possibilidade de as partes reagirem aos
atos que lhe sejam desfavoráveis. Os contendores têm direito de
deduzir suas pretensões e defesas, de realizar as provas que
requereram para demonstrar a existência de seu direito, em suma,
direito de serem ouvidos paritariamente no processo em todos os seus
termos.” (NERY Júnior, Nelson. Princípios de processo civil na
Constituição Federal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2002, p. 137)
É
patente a supremacia desta garantia constitucional no novo CPC,
conforme se pode notar de sua própria exposição de motivos:
“A
necessidade de que fique evidente a harmonia da lei ordinária em
relação à Constituição Federal da República fez com que se
incluíssem no Código, expressamente, princípios constitucionais,
na sua versão processual. Por outro lado, muitas regras foram
concebidas, dando concreção a princípios constitucionais, como,
por exemplo, as que preveem um procedimento, com contraditório e
produção de provas, prévio à decisão que desconsidera da pessoa
jurídica, em sua versão tradicional, ou às ‘avessas’. Está
expressamente formulada a regra no sentido de que o fato de o juiz
estar diante de matéria de ordem pública não dispensa a obediência
ao princípio do contraditório.”
Em
doutrina, tem-se disseminado dois sentidos axiológicos
complementares do princípio do contraditório. O primeiro é o
chamado “contraditório fraco”, consistente na bilateralidade da
audiência, o que permite uma paridade de armas nas pretensões dos
litigantes levadas a juízo. Em miúdos, é o direito de resposta no
bojo processual. De outro lado, hodiernamente surge a ideia de uma
processo judicial democrático em que as partes tenham a
possibilidade de efetiva influência e colaboração na formação da
decisão judicial. Assim, o dever de diálogo decisório prévio,
inerente ao modelo cooperativo de processo, consubstancia-se no
propalado “contraditório forte”.
Nesse
sentido:
“Entender
o contraditório como simples bilateralidade da instância implica
que apenas as partes são os seus destinatários e que o conteúdo de
dito princípio se esgota no binômio conhecimento-reação, é
dizer, o direito de uma parte de conhecer as alegações feitas no
processo pela outra e de se manifestar a respeito. Assim mesmo, essa
visão exclui o juiz como mais um destinatário do contraditório, o
qual tem enorme influência não apenas na forma de conduzir o debate
judicial, mas também na própria motivação das decisões
judiciais. Esse entendimento responde à figura de contraditório em
sentido fraco.
Contraposto
à noção de contraditório fraco encontra-se o contraditório em
sentido forte. Já não se trata apenas de um direito de conhecer e
reagir, mas principalmente de um verdadeiro direito de influência no
desenvolvimento do processo e na formação da decisão que, como ato
de poder do Estado, será suportada pelas partes. O contraditório já
não pode ser entendido apenas como a caracterização da essência
do processo. Se é bem verdade que esse enquadramento é
absolutamente correto, o contraditório não pode se esgotar nessa
dimensão, mas, na realidade, deve ser visto como valor-fonte do
próprio processo, capaz de promover o exercício de uma democracia
participativa e o de ser um instrumento adequado para a busca da
verdade no processo.” (CAVANI,
Renzo. Contra as "nulidades-surpresa": o direito
fundamental ao contraditório diante da nulidade processual. Revista
dos Tribunais Online, vol. 218, p. 65, Abr/2013)
Nota-se
que o “contraditório forte” está presente na vedação de
decisões surpresas, impossibilitando
o juiz de proferir decisão contra uma das partes sem a sua oitiva
prévia, consoante disposições contidas nos artigos 9º e 10 do
novo CPC:
"Art.
9º. Não
se proferirá sentença ou decisão contra uma das partes sem que
esta seja previamente ouvida, salvo se se tratar de medida de
urgência ou concedida a fim de evitar o perecimento de direito.
Art.
10. O
juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em
fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes
oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a
qual tenha que decidir de ofício."
Por
fim, impõe-se mencionar que o C. TST, por meio da Instrução
Normativa 39 de 2016, mitigou a aplicabilidade do “contraditório
forte” no processo do trabalho, conforme se pode notar da dicção
do artigo 4º da referida regulamentação:
“Art.
4° Aplicam-se ao Processo do Trabalho as normas do CPC que regulam o
princípio do contraditório, em especial os artigos 9º e 10, no que
vedam a decisão surpresa.
§
1º Entende-se por “decisão surpresa” a que, no julgamento final
do mérito da causa, em qualquer grau de jurisdição, aplicar
fundamento jurídico ou embasar-se em fato não submetido à
audiência prévia de uma ou de ambas as partes.
§
2º Não se considera “decisão surpresa” a que, à luz do
ordenamento jurídico nacional e dos princípios que informam o
Direito Processual do Trabalho, as partes tinham obrigação de
prever, concernente às condições da ação, aos pressupostos de
admissibilidade de recurso e aos pressupostos processuais, salvo
disposição legal expressa em contrário.”
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