Teoria do risco criado e sua aplicação ao Direito do Trabalho
O sistema civil de
responsabilização sofreu grande impacto com a promulgação do
Código Civil de 2002, porquanto seguindo a tendência de fixação
do eixo axiológico da dignidade humana, passou a focar sua atenção
no ofendido e não mais no ofensor buscando a máxima reparação, o
que gerou ampliação das hipóteses de responsabilização e também
mitigou a importância da culpa.
Deste modo a responsabilidade
civil objetiva ganhou força e inúmeras teorias justificam a
aplicação desta.
A teoria do risco criado teve
como foco de sua criação a busca de reparação na hipótese de
acidente do trabalho ainda na época da competência da Justiça
Comum, é também chamada de teoria do risco profissional, sendo
prevista no artigo 927, parágrafo único do Código Civil. Teve
como um de seus precursores, Caio Mário da Silva, para quem o
conceito de risco que melhor se adapta às condições de vida social
é o que se fixa no fato de que, se alguém põe em funcionamento
qualquer atividade, responde pelos eventos danosos que esta atividade
gera para indivíduos e tem foco na atividade normalmente
desenvolvida que causa um ônus maior aos referidos indivíduos do
que aos demais membros da coletividade.
A responsabilidade objetiva,
independe da demonstração da culpa, mas tem fundamento no nexo
causal, merecendo destaque as excludentes de referido nexo
identificadas como caso fortuito e da força maior. O artigo 393 do
Código Civil não faz distinção entre ambas, sendo certo que
existe divergência doutrinária a respeito.
De qualquer sorte, podemos
considerar como caso fortuito o evento improvável e imprevisível,
ao passo que força maior seria evento inevitável, porém
previsível, mas considerado inevitável por se tratar de fato
superior às forças do agente, sendo denominados fatos da natureza.
Atualmente a força maior ainda
é considerada como excludente de responsabilidade, quando
demonstrada sua real inevitabilidade em grandes catástrofes
naturais, como chuvas além do normal ou terremotos que são de
improvável incidência no Brasil.
Com relação ao caso fortuito,
em sua aplicação conjunta com a teoria do risco criado, vem sendo
admitida a diferenciação entre o caso fortuito externo, que não
teria ligação com a atividade normalmente desenvolvida pelo acusado
ao passo que o caso fortuito interno, que estaria ligado à atividade
normalmente desenvolvida pelo agente causador do dano e neste caso
não estaríamos diante de excludente de responsabilidade.
Tal diferenciação já
encontra incidência na jurisprudência conforme sedimentado por meio
da Súmula 479 do STJ e do Enunciado 443 do CJF na V Jornada de
Direito Civil em 2011. O Pleno do C.TST decidiu de forma semelhante
em recente julgado sobre o tema com relação à responsabilização
da empregadora que atua no serviço de transporte coletivo urbano em
decorrência de danos causados a cobradora de ônibus durante assalto
(RR–184900-63.2007.5.16.0015).
Em que pese alteração do
paradigma bem como o objetivo de tal teoria, ainda não é
sedimentada a aplicação da responsabilidade objetiva na hipótese
de acidente do trabalho, existindo parcela da doutrina e
jurisprudência que defende a existência de responsabilidade
subjetiva com fundamento do artigo 7º, XXVIII da Constituição
Federal, porém entendemos que a Constituição estabeleceu
parâmetros mínimos, nos termos do caput do artigo 7º da
Constituição Federal e o artigo 927, parágrafo único é posterior
e mais benéfico devendo ser aplicado também nos casos de acidente
de trabalho, porquanto se insere perfeitamente no conceito de exercício de “atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano” no presente dispositivo em comento.
Entendemos como consentâneo à
evolução da responsabilização civil no ordenamento jurídico que
o artigo 927 parágrafo único do Código Civil deve também ser
aplicado no Direito do Trabalho sob pena de ocorrência de
interpretação teratológica, porquanto em um ramo do Direito no
qual temos a relação entre pessoas materialmente iguais teríamos
maior intensidade de responsabilização ao passo que no Direito do
Trabalho teríamos situação inversa.
Pode-se afirmar o mesmo com
relação à ausência de exclusão de responsabilidade quando
identificado o caso fortuito interno, que seria um acréscimo à
teoria da responsabilidade civil pelo risco criado, motivo pelo qual
consideramos acertada a citada decisão do Pleno do Colendo Tribunal
Superior do Trabalho.
* Esta postagem é de autoria do colaborador Dr. Glauco Bresciani
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