LEI DO PAVILHÃO E PRINCÍPIO DO CENTRO DA GRAVIDADE
O
trabalho marítimo ou aeronáutico, rege-se pela denominada lei do
pavilhão ou bandeira. Por esta, a norma aplicável aos contratos de
trabalho em tais meios de transporte seria do país em que se
encontra registrada a aeronave ou embarcação. Esta conclusão
decorre da aplicação da Convenção Internacional de Direito
Internacional Privado (Código Bustamante, em seus artigos 279, 281 e
282). No entanto, a lei do pavilhão encontra ressalvas que devem ser
ora pontuadas.
Na
realidade, o empregador do trabalhador marítimo é o armador, e não
o navio. Não bastasse, ocorre do armador eleger seu centro principal
de negócios localidade diversa do registro da embarcação. Nestas
situações, a lei do pavilhão deve ser relativizada, de modo a
aproximar a situação com a regra geral da territorialidade,
definindo a regência normativa do contrato pelas leis do local em
que o empregado fica habitualmente à disposição do empregador
antes ou depois da realização das viagens.
Caso
esteja evidenciada a intenção fraudulenta, a questão resolve-se
pelo art. 9º da CLT, a impedir a frustração dos direitos
trabalhistas conferidos ao empregado brasileiro, aplicando-se a
legislação nacional. É o que ocorre para as situações de
“bandeiras de favor”, amplamente denunciadas no Direito Marítimo,
prática pela qual o navio é registrado intencionalmente num
determinado país em razão de legislação mais permissiva a uma
determinada conduta (geralmente considerada irregular nas legislações
nacionais), pretendida pelo empresário.
Não
bastasse, imaginemos um navio estrangeiro presente em águas
brasileiras com a finalidade de desenvolver atividades comerciais (de
turismo, por exemplo) e, para tanto, contrata trabalhadores
brasileiros. Neste caso, não seria razoável excluir o critério da
territorialidade apenas pelo fato de que a embarcação esteja
registrada em outro país, já que o trabalhador terá sido admitido
no Brasil, e aqui prestou serviços, ainda que posteriormente
desenvolva atividades em águas internacionais ou mesmo vinculadas a
outro país. Este entendimento faz-se necessário para que a
legislação laboral não seja desvirtuada, deixando contratos de
trabalho sem o necessário amparo da legislação brasileira. É que
a regra do pavilhão foi consagrada como forma justamente de
beneficiar o trabalhador, não podendo ser, assim, invocada para
frustrar as proteções legais mínimas que conferem dignidade ao
trabalho. E, fixada a legislação brasileira aplicável a tais
contratos, poderá ser aplicada a lei 7.064/82 de forma a considerar
a prestação de serviços em águas internacionais ou estrangeiras
como sendo situação de transferência de empregado brasileiro para
o exterior, de modo a incidir a teoria do conglobamento por instituto
para identificação das normas aplicáveis ao contrato neste
período, elegendo a legislação brasileira ou da lei da bandeira do
navio, de acordo com o que for mais favorável por instituto. A
solução proposta evidencia aplicação do denominado princípio do
centro da gravidade, pelo qual, dada a relevância do direito, é
possível afastar a aplicação das regras de direito internacional
privado. Na jurisprudência do TST, inclusive, encontramos precedente
a relativizar a regra do pavilhão, conforme se verifica na seguinte
ementa:
Ementa: TRABALHO EM NAVIO ESTRANGEIRO - EMPREGADO PRÉ-CONTRATADO NO BRASIL - CONFLITO DE LEIS NO ESPAÇO - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. 1. O princípio do centro de gravidade, ou, como chamado no direito norte-americano, most significant relationship, afirma que as regras de Direito Internacional Privado deixarão de ser aplicadas, excepcionalmente, quando, observadas as circunstâncias do caso, verifica-se que a causa tem uma ligação muito mais forte com outro direito. É o que se denomina "válvula de escape", dando maior liberdade ao juiz para decidir que o direito aplicável ao caso concreto. 2. Na hipótese, em se tratando de empregada brasileira, pré-contratada no Brasil, para trabalho parcialmente exercido no Brasil, o princípio do centro de gravidade da relação jurídica atrai a aplicação da legislação brasileira. Processo: ED-RR - 12700-42.2006.5.02.0446 Data de Julgamento: 06/05/2009, Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 22/05/2009.
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Esta postagem é de autoria do juiz do trabalho e professor FABIANO
COELHO DE SOUZA.
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