Responsabilidade civil objetiva na seara trabalhista
Em
regra, tratando-se de acidente de trabalho, a responsabilidade civil
dos danos perpetrados é eminentemente subjetiva, consoante expressa
disposição normativa contida no art. 7º, inciso XXVIII, da
Constituição Federal. Nesse diapasão, com base nos arts. 186 e 927
do Código Civil, é necessário para que se impute o dever de
indenizar ao empregador o preenchimento dos seguintes requisitos: a)
existência de dano certo e subsistente; b) nexo causal da conduta
ilícita com o dano perpetrado e; c) elemento subjetivo: dolo ou
culpa no desencadeamento do infortúnio.
Não obstante o fato de que,
de um modo geral, a responsabilidade civil do empregador em
decorrência do acidente de trabalho deva decorrer da culpa, não se
pode olvidar a existência de uma grande variedade de atividades,
situações e ambientes laborais que se utilizam de processos
produtivos que envolvem a ideia de risco (art. 927, parágrafo único,
do Código Civil). Assim, excepcionalmente, em casos de atividades de
risco que refogem ao parâmetro ordinário verificado no contexto
social, admite-se a responsabilização por acidente de trabalho de
forma objetiva, prescindindo da comprovação do elemento subjetivo.
Com
efeito, o Código Civil adotou uma postura objetivista da
responsabilidade civil. O parágrafo único do artigo 927 dispõe que
haverá a obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa
(desde que se comprove a conduta lesiva, o dano e o nexo causal), em
dois casos: a) nas hipóteses previstas em lei e; b) quando a
atividade normalmente desenvolvida pelo agente implicar, por sua
natureza, risco para os direitos de outrem.
O
primeiro caso é assaz visivo. Porém, a segunda hipótese é fonte
de acirradas discussões na doutrina e na jurisprudência. Trata-se
de cláusula geral com conceitos indeterminados, cabendo ao juiz
operá-la no caso concreto.
A
expressão “atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano”
deve ser entendida como o exercício regular de atividade
potencialmente danosa e nociva aos direitos de terceiro, na busca de
um determinado proveito, geralmente de natureza econômica, sendo
vedada aquela atividade meramente esporádica ou momentânea.
Em
torno da ideia central do risco surgiram várias modalidades deste,
dentre as quais podem ser destacadas as teorias do: a) risco-proveito
(responsabilidade do dano arcado por quem tira proveito ou vantagem
do fato lesivo); b) risco profissional (indeniza-se pela atividade
laboral ou profissão do lesado); c) risco excepcional (é reparável
o dano ainda que escape da atividade comum da vítima); d) risco
criado (responsabiliza-se o dano da atividade em si mesma, independe
do resultado bom ou mau que dela advenha para o agente); e) risco
integral (dever de indenizar até nos casos de inexistência do nexo
causal, mesmo que haja alguma excludente de responsabilidade).
Todavia,
na vertente de Sílvio Venosa, “qualquer que seja a qualificação
do risco, o que importa é a sua essência: em todas as situações
socialmente relevantes, quando a prova da culpa é um fardo pesado ou
intransponível para a vítima, a lei opta por dispensá-la.”
(Silvio de Salvo VENOSA, Direito Civil, Vol. IV, 2007, p. 15.)
Qualquer
hipótese de risco está ligada à ideia de probabilidade de
ocorrência de um evento desfavorável. O dever de indenizar não
mais encontra amparo no caráter da conduta do agente causador do
dano, mas sim no risco que o exercício de sua atividade causa para
terceiros, em função do proveito econômico daí resultante.
É
preciso mencionar que não há antinomia entre a regra prevista no
art. 927 do Código Civil e o art. 7º, XXVIII, da Constituição
Federal, uma vez que na seara trabalhista prima-se por uma solução
jurídica consentânea com o princípio da proteção, já que a
própria ordem constitucional garante outros direitos que visem a
melhoria da classe trabalhadora (art. 7°, caput, da Constituição
Federal).
Calha
mencionar que, embora minoritária, existe corrente que propugna a
regra da responsabilização objetiva do empregador por todos os
danos perpetrados no meio ambiente de trabalho. O meio ambiente do
trabalho faz parte do conceito mais amplo de ambiente, de forma que
deve ser considerado como bem a ser protegido pelas legislações
para que o trabalhador possa usufruir de uma melhor qualidade de
vida. Neste viés, e com base no comando contido no art. 225, § 3°,
da Constituição Federal, tem-se que o vilipêndio causado ao
ambiente laboral deve ser apurado de forma objetiva.
Destarte,
por uma interpretação teleológica da legislação infortunística,
tem-se que é plenamente aplicável a responsabilidade objetiva do
empregador por prejuízos verificados na relação de trabalho. Ora,
tal postura hermenêutica respalda a socialização dos riscos,
garantindo à parte mais vulnerável da relação de emprego,
principalmente naquelas atividades laborais que envolvam risco
extraordinário à incolumidade física e mental dos trabalhadores, a
reparação de danos causados no meio ambiente de trabalho, tudo em
respeito aos princípios da restitutio in integrum e do
neminem laedere.
0 comentários:
Postar um comentário